A Mega da Virada está com apostas abertas e pode pagar R$ 600 milhões nesta edição, a maior da história da loteria. Com a aproximação do sorteio, começam as conversas entre amigos, colegas de trabalho e parentes que apostam em bolões: o que fazer com tanto dinheiro? O quanto seria necessário para deixar de trabalhar? R$ 1 milhão já bastaria?
“Depende. Dinheiro nunca é suficiente. Dá para fazer investimentos, mas não parar de trabalhar, porque sempre temos que fazer o dinheiro evoluir. Dá para ter uma vida mais confortável”, avalia o consultor de vendas Bruno Stéfano, de 34 anos. “Dinheiro acaba. Temos que trabalhar, fazer alguma coisa, ou entramos em depressão”, completa a técnica de enfermagem Teresa Melo, 56.
Colocar os R$ 600 milhões da Mega na poupança, um dos investimentos com menor retorno no mercado, renderia cerca de R$ 3 milhões só no primeiro mês. Mas mesmo uma quantia mais modesta, um único milhão, superaria a renda média que os brasileiros conseguem trabalhando. Partindo da ideia de que a pessoa não mudaria seus hábitos de vida, seria, sim, possível deixar de trabalhar e manter a mesma renda.
O trabalhador ganha, em média, R$ 3.227, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad). Em um único mês na poupança, R$ 1 milhão renderia R$ 5.982, considerando o rendimento de outubro a novembro. Levando em conta investimentos mais rentáveis, a diferença para a renda média dos brasileiros é maior ainda. No Tesouro Direto ou no CDB com liquidez (isto é, que permite retirada do dinheiro a qualquer momento), o milhão renderia R$ 9.279,58. Mas, no caso desses investimentos, há incidência de Imposto de Renda, por isso o líquido baixa para R$ 7.191,67.
“Vou te falar que R$ 1 milhão é baixo, mas isso varia muito com o perfil do investidor e qual é o custo de vida dele. Se você virar para um trabalhador da classe C e falar que ele ganhou R$ 1 milhão, ele consegue viver pelo resto da vida e manter esse capital. Mas um empresário com gastos de R$ 20 mil por mês acaba com esse dinheiro rapidinho”, pondera a assessora da Valor Investimentos, escritório credenciado pela XP Investimentos, Jhady Vasconcelos.
Ela pontua que os investimentos com maior liquidez são os menos rentáveis. Por isso, recomenda diversificar a carteira e distribuir o dinheiro em diferentes fontes. “Seria mais inteligente ter um portfólio diversificado. É possível montar uma carteira com títulos de créditos que fazem pagamentos mensais. Há estratégias para mexer só nos rendimentos, e não no valor original”, diz. Ela diz nunca ter atendido alguém que ganhou na Mega, mas que não é incomum clientes que desejam se aposentar mais cedo e preparam um plano para isso. “Tem clientes que pretendem se aposentar com 40 anos e fazem um aporte maior”, conta.
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O TEMPO já explicou que a chance de ganhar na Mega é baixíssima: com uma aposta simples, ela é de uma em cerca de 50 milhões. “Se uma pessoa faz cem apostas simples por ano, sua chance de ganhar é de uma vez em 500 mil anos”, detalha o matemático da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Gilcione Costa. Mas ele compreende que fantasiar é inevitável. “É uma diversão. Viver sem sonhar é complicado, e a loteria é uma maneira de realizar seus sonhos”.
Saber como a probabilidade de vitória é baixa não reduz a esperança. Em um artigo sobre a psicologia por trás das apostas, o professor da Universidade Nottingham Trent, no Reino Unido, Mark Griffiths, especialista no tema, examina: “as pessoas tendem a superestimar consequências positivas e subestimar consequências negativas. Por exemplo, se alguém ouve que tem uma chance em 14 milhões de ser morto em um sábado qualquer, dificilmente pensará duas vezes sobre isso, porque a chance parece minúscula. Mas se a chance é a mesma de ganhar na loteria, as pessoas de repente ficam super otimistas”.
Evidentemente, uma grande soma de dinheiro resolve alguns problemas. A euforia de abandonar qualquer tipo de trabalho, contudo, pode ter um lado sombrio, lembra o professor de psicologia da Una Luiz Guilherme Mafle. “O trabalho tem um outro significado, que é você conseguir ser útil para a sociedade. Então, pode ser que, por seis meses ou até um ano, a pessoa que decide não trabalhar suporte, mas é comum começar a adoecer psicologicamente”.
“Dinheiro, satisfação e realização pessoal têm uma correlação até certo limite. Ela é limitada, mas existe. É claro que, se você não tem condição mínima para ter seu nível de subsistência, não consegue ter sua própria casa, transporte de qualidade e alimentação, isso tudo causa um sofrimento psicológico evidente. Então, falar que o dinheiro não traz felicidade, até certo ponto, é uma besteira. Agora, a partir do momento em que vira excesso, que já vai além da conta, ele já não vai fazer tanta diferença assim”, conclui o professor.
O tempo